domingo, 14 de março de 2010

O segredo do Espelho

E ela ficava ali sentada, fitando o Espelho.
Se perguntando quantas mais poderiam existir além dela.

Já era hábito antigo, tornára-se algo comum. Refletir sobre o próprio reflexo. Até o ponto em que já não via uma imagem, sabia que enxergava além, ou simplesmente, não enxergava. Ou não refletia.
A ideia da visão da imagem era muito simples. Ela queria mais, sabia que aquele pedaço vazio podia lhe dar mais. Ele lhe devia aquela explicação.

Recordava dos momentos da infância em que se via sentada, de frente ao espelho do quarto. Moldurado, madeira de carvalho. Claro que não sabia se era carvalho, mas queria acreditar que era. Baseáva-se no pensamento de que somente uma madeira vinda de uma árvore com a grandeza e a beleza de um carvalho era capaz e digna de deter a incrível extensão do Espelho.
Era óbvio que o Espelho não acabava ali. Ele se continha, ele estava simplesmente preso ali.
Ah, mas ela sabia que ele não terminara, não ali.

Será que só ela compreendia o fato de que, no fundo, ninguém compreendia a total profundidade do Espelho?
Não importa, deixe eles se enganarem. Ela jamais caíra ao engano.
De certo que, no fim, ela se sentia enganada por ele. Já não bastava ficar ali fitando aquele pequeno grande pedaço translúcido e refletor. Ele ainda lhe devia explicações. Sentia, sem saber como sabia sentir, que ele não era sincero.
Aquela imagem, aquele estranho desenho de jeans azul e camisa branca. Os detalhes bordados, os minuciosos tons de castanho ao longo do cabelo. Tudo aquilo parecia tão irreal.
Não importa se a imagem era tão fiel, ela sabia sentir que não era.

Daria sua vida para poder estar do outro lado. Poder estar como ele, ver exatamente como ele via. Só assim ela sentiria e saberia a verdade. Não confiava naquela imagem. Precisava da verdade. Doesse o que tivesse de doer para poder, assim, ver.

Por certo momento se viu tomada pela raiva. Maldito seja, espelho mentiroso. Omiti de nós nossas verdadeira imagens! Guarda para si o orgulho de ser o único a enxergar o mundo mais real que o reflexo do mundo real.
Mas aí então, a raiva passava. Ela o compreendia. Ele queria era guardar segredos. E o segredo bem guardado é aquele que se esconde numa caixa, de preferência, de carvalho.
De fato todos têm seus segredos. Mas ninguém sabe. Se soubessem, não seriam mais segredos. Ela tinha, outros tinham e ele, o Espelho, tinha.
O passo da compreensão era anterior e muito próximo ao passo do perdão.

Ela o perdoára. Ele nos escondia de nós mesmos. Devia ter seus motivos...
Não, é claro que tinha motivos! Ela sabia que os tinha, mas escondeu este segredo.
O segredo de saber que haviam motivos. E agora, este era o seu segredo para guardar junto ao seu próprio orgulho. O orgulho de também possuir algo secreto.
Então veja, Espelho, que não é só você que tem seus segredos.

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"Esta perseguição foi inspirada e dedicada às ideias de Carolina Alves.
Uma amiga de grandiosas ideias e de um dos mais belos corações que já conheci."

2 perseguições:

Unknown disse...

Muito foda o texto, curti muito.

Unknown disse...

Cara, adorei o texto, sério msm.
Vc tem um tipo de texto parecido com meu pensamento, assim cortado. Com muitos pontos, frases de uma palavra só. Adorei!

Ah, aqui é a Luiiza da comu do R.Sigma

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